sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Surdite aguda

O caso BPN:
A história daqueles que ninguém quis ouvir.

Em Março de 2001 a revista Exame dedicou uma extensa investigação ao BPN, questionando o seu ritmo de crescimento e as elevadas taxas de remuneração para depósitos.

O resultado desse trabalho foi um processo em que Oliveira e Costa pediu uma indemnização de 5 milhões de euros ao então director da revista, Camilo Lourenço. Este acabou despedido e como é habitual nestas coisas a sua carreira não foi propriamente benefi ciada por ter publicado tal trabalho.

Os jornalistas de investigação em Portugal são heróis, caso residam nos EUA e escrevam de preferência sobre a podridão das administrações republicanas.
Quando se dedicam aos democratas ou sobretudo ao que sucede na lusa pátria, passam a
lunáticos, na melhor das hipóteses.

Nos anos seguintes após a publicação deste trabalho pela Exame pessoas bem informadas
como o então ex-primeiro-ministro Cavaco Silva colocaram parte das suas poupanças na SLN, a holding do BPN. Instituições privadas tradicionalmente muito bem informadas como o são algumas dioceses também abriram contas no BPN.

Vários governos portugueses depositaram no BPN importantes verbas da Segurança Social: em Agosto de 2008 o Ministério do Trabalho e da Segurança Social tinha depositado no BPN 500 milhões de euros provenientes das contribuições para a Segurança Social efectuadas por trabalhadores e empresas.

Em Junho de 2009, Vítor Constâncio na qualidade de governador do Banco de Portugal,
declarou no Parlamento: “Realmente ninguém no Banco de Portugal suspeitou, pensou, que o dr. Oliveira Costa fosse capaz do tipo de coisas que aconteceram no BPN (…). Será ingenuidade? Talvez, admito.” Temos de admitir que para lá da ingenuidade houve muita mas mesmo muita fé e muita vontade de não ouvir nem ver.

Para azar de alguns nesta terrena divisão da capacidade de se fazerem ouvir, coube-lhes a eles o papel de sibilas Cassandras, a quem só o tempo dá razão. No caso do BPN esse papel esteve reservado para a revista Exame em 2001 e para Miguel Cadilhe em 2008.

Após ter sido nomeado presidente da SLN em Junho de 2008, Cadilhe pediu
várias auditorias à holding e em Outubro denunciou ao Ministério Público os crimes financeiros praticados no BPN. Em Novembro de 2008 apresentou um plano de saneamento do BPN que custaria 600 milhões de euros. O Governo optou pela nacionalização.

Convém lembrar o que disse então Miguel Cadilhe: “A nacionalização vai exigir muito mais capital público.” Consola dizer que tinha razão?

MANUEL ROBERTO
Público, 6 Janeiro 2011

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