quarta-feira, 30 de março de 2011

Direito ao contraditòrio

Austeridade: ou há moralidade ou comem todos

Começa a ser tempo de se perceber que a melhor forma de sair da situação em que o país se encontra é repartindo a austeridade de forma a que penalize o menos possível cada português. Mas não é isso que os políticos, os grupos corporativos e algumas “associações cívicas de pressão” defendem. Os políticos avaliam a austridade pelo impacto nos votos e nos interesses que representam, os grupos corporativos exigem ficar acima dos problemas e alguns cidadãos organizam-se para que as suas despesas sejam pagas pelos outros.


Os programas de austeridade não devem ser avaliados apenas pelo seu impacto nas contas públicas, mas também pela forma como o custo social desse impacto é repartido pelos portugueses. Mas não é isso a que estamos a assistir e o resultado é a distribuição desigual do impacto da asuteridade, os banqueiros ficam de fora porque a banca tem de sobreviver, os pobres, incluindo os muitos falsos pobres beneficiam do choradinho político, os profissionais de saúde dos sector privado têm o guarda-chuva dos partidos cujos dirigentes são patrocionados pelo sector.


Não faz sentido que um funcionário público no activo perca mais de 10% do seu rendimento de um dia para o outro, quando outros que se aposentaram com cinquenta anos de idade e que ficaram a ganhar mais de pensão do que de vencimento fiquem de fora. Não é aceitável que se apoie cortes dos vencimentos ao mesmo tempo que se exige a manutenção das SCUT nos concelhos onde governa o PSD. É uma estupidez o ministro das Finanças desorganizar o fisco com uma fusão ao mesmo tempo que mantém os cargos que criou e que se revelaram inúteis, como é o caso dos controladores financeiros. É uma hipocrisia falar da reestruturação da Administração Pública e manter os governos civis ou manter um modelo municipalista absurdo. É um absurdo exigir as universidades gratuitas e pagar quinhentos euros no infantário.


Nesta condições é inevitável que as medidas de austeridade sejam mais injustas do o necessário, porque incidem sobre quem não tem capacidade reivindicativa ou sobre os que são desprezados eleitoralmente pelos partidos. Sócrates decidiu sacrificar os funcionários públicos melhor remunerados porque concluiu que perdia menos votos sacrificando os que muito provavelmente não votarão nele, Pedro Passos Coelho propõe um aumento absurdo do IVA porque assim dilui o impacto e poupa o sector privado da saúde que tem lucros elevados à custa dos benefícios sociais da saúde. Francisco Louçã e Jerónimo de Sousa continuam a defender que devem ser os ricos que paguem a crise. Os autarcas querem que seja a Administração Central a suportar a crise para que eles possam manter a sua influência continuando a construir rotundas muito floridas e a levar os velhinhos a Fátima ou a passear de avião.


O resultado desta austeridade à la carte é a crescente divisão dos portugueses, o prolongamento da crise e mais recessão. Os empregados do sector privado acusam os funcionários públicos de responsáveis pela crise porque é isso que está implícito em medidas como aumentar os ordenados dos que menos ganham como fez Ferreira Leite ou cortar os vencimentos dos que mais ganham como decidiu Sócrates. Os mais pobres acreditam mesmo que a solução está em cortar nos malandros dos mais ricos, precisamente aqueles de que se espera mais investimento. Os portugueses que moram na província exigem as SCUT porque acham que os da capital são uns malandros. No fim, quando nada resulta, fazemos manifestações a dizer que estamos à rasca por causa dos políticos.


Sócrates é bem capaz de ter razão nos cortes dos vencimentos mas nesse caso deve cortar a todos e não deixar de fora os pensionistas que não foram alvo das suas reformas. Passos Coelho tem razão ao defender um aumento dos impostos mas talvez esse aumento dos impostos deva ser distribuído por todos os impostos. Louçã tem alguma razão ao defender o combate à evasão fiscal mas tal combate não resolve qualquer crise pois os seus resultados só serão visíveis dois, três anos depois.


A solução passa por distribuir os custos pelo maior número de portugueses e pelo maior número possível de medidas, desta forma haverá mais equidade, os sacrifícios suportados por cada um serão menores e o impacto na economia será minimizado. Mas isso implica que os políticos deixem de pensar a austeridade em função dos votos ou da protecção dos seus boys. Se continuarem a fazê-lo poderão ganhar votos, conseguirão manter os lugares para as suas clientelas, cumprirão os compromissos que assumiram com os seus financiadores, mas conduzirão o país ao desastre.

Publicada por Jumento
http://jumento.blogspot.com/

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