sexta-feira, 15 de abril de 2011

RENOVADORES

Caros camaradas,
Intervenção realizada no CN


1 - O essencial do que vos tinha para dizer já o deixei expresso no texto que há dias vos enviei "Recusemos a fatalidade!". Vou apenas sublinhar e aprofundar algumas ideias que então exprimi.

Como procurei argumentar no referido texto, a indispensável ajuda da esquerda para derrubar o governo PS ( numa obscena "coligação negativa" com a direita e a extrema -direita, e cujos detalhes de bastidores da negociação das votações quando forem conhecidos nos farão corar de vergonha!), foi um monumental erro politico que vai pagar caro. E a primeira consequência é que já lhe diminuiu a autoridade politica para, na campanha eleitoral, usar como argumento os acordos e votações parlamentares do PS com o PSD e com o CDS-PP. Mas o mais grave, são as consequencias muito negativas para o país decorrentes da queda do governo PS e da marcação de eleições legislativas antecipadas, que já se fazem sentir e que vão agravar ainda mais as condições de vida dos portugueses.

Como explica a esquerda que tenha dado a sua indispensável ajuda para derrubar um governo PS, sabendo que, com alto grau de probabilidade, o governo saído das eleições legislativas antecipadas, será um governo PSD/CDS-PP ? E mesmo que o PS volte a ganhar, como explica a esquerda ter ajudado a provocar uma crise politica que agudizou a crise económica e financeira já existente, e cujas consequências vão recair, inevitavelmente, sobre aqueles que, supostamente, deveria defender?

Fizeram-no em nome dos "sacrossantos princípios" ? Ou da "pureza ideológica" ? Não. Por favor, deixem-se de demagogia. Fizeram-no simplesmente por egoístas interesses partidários. Ponto final!

Compreende-se que o PSD tenha provocado esta crise politica. Passos Coelho começava a ver o terreno a fugir-lhe debaixo dos pés. E a avolumarem-se sinais de impaciência no partido que, a continuarem, poriam em causa a sua liderança.

Mas é absolutamente incompreensível que a esquerda se tenha deixado ( conscientemente ) manipular pelo PSD, e lhe tenha oferecido a sua indispensável ajuda para concretizar a sua estratégia partidária!

2 - Não tenho qualquer simpatia pessoal por José Sócrates ( aliás, nunca votei nele, ao contrário de outros que agora o crucificam! ), mas tenho a honestidade intelectual suficiente para reconhecer que ele não tem só defeitos. E nunca deixei que esta minha apreciação me toldasse o raciocínio. Por isso centro as minhas críticas e comentários à sua actuação concreta e às medidas e resultados do seu governo.

Tão-pouco simpatizo com Francisco Louçã, e há alturas em que faço um enorme esforço para ouvir ou ler a sua retórica demagógica e pseudo-moralista. Mas também isso não me impede de lhe reconhecer qualidades.

Pode não parecer, mas já tenho 62 anos! E a vida já me ensinou muita coisa! Por exemplo, a ver com alguma reserva aqueles que estão sempre com o dedo apontado ao comportamento dos outros e sempre prontos a erigir-se em paladinos da honestidade e da moral.

Compreendo que a direita e a extrema-direita queiram substituir o actual líder do PS. Ele é, de facto, um obstáculo ao seu regresso ao poder. Mas já me é incompreensível que a esquerda afine pelo mesmo diapasão, uma vez que sempre fizera depender o seu apoio ao governo PS do abandono das "politicas de direita e neoliberais", e não dos seus executantes.

Ora, a eventual substituição de José Sócrates em nada iria alterar o rumo da governação e, ao contrário ( a ver pelas declarações dos seus putativos sucessores ) até se ía deslocar mais para a direita. Portanto, não tendo qualquer base racional, esta atitude da esquerda não passa de uma refinada hipocrisia politica, que tem como objectivo disfarçar a incomodidade duma situação que ela própria criou.

Todos nos lembramos do que dissemos de Mário Soares e, no entanto, todos acabamos a votar nele!

De facto, o problema do PS ser o que é, pouco ou nada tem a ver com o seu líder de momento, mas sim com a sua matriz ideológica, com o seu ADN, com os tempos do PREC, com a sua base social de apoio, etc. Tão-pouco a sua imaginária "ala esquerda" conseguirá inverter as suas politicas, como se tem visto ao longo dos anos ( a propósito, Manuel Alegre e Ferro Rodrigues foram eleitos na lista de José Sócrates para a comissão politica nacional no congresso de Matosinhos!), embora reconheça que não se deva subestimar a existência de um conjunto de pessoas dispersas com uma sensibilidade "mais de esquerda" no partido e nos seus orgãos de direcção.

Mas, curiosamente, o que em minha opinião pode alterar "as politicas de direita" do PS está nas mãos da esquerda!

4 - Como há algum tempo afirmei, a estratégia de fracturar o PS e de "convergencia" com a sua "ala esquerda" findou o seu prazo de validade. As eleições presidenciais e a moção de censura (?) do BE foram o toque de finados! E o BE percebendo isso mudou de estratégia e ensaiou uma aproximação ao PCP ( até parece que a iniciativa do Trindade foi há muito tempo! ), embora, inexplicavelmente o tenha feito poucos dias depois de ter recusado uma proposta da FUR que sugeria o mesmo! Enfim, o BE já nos habituou a este comportamento errático.

Com a mesma frontalidade com que há anos a fio critico o sectarismo hegemónico do PCP e o sectarismo elitista do BE,quero agora manifestar a minha satisfação e saudar esta iniciativa, já há muito reclamada por alguns renovadores, em especial pelo Carlos Brito.

Espero que finalmente o PCP reconheça que não é "o dono" da esquerda, e que o BE finalmente perceba que não há alternativa de esquerda sem o PCP. E se isto foi conseguido, já valeu a pena este primeiro encontro!

No entanto, a estratégia do PCP a que agora se colou o BE nada tem de novo e não resolve o problema com que nos defrontamos. Vejamos:

O PCP e Jerónimo de Sousa têm dito repetidas vezes que " o PCP será governo quando o povo quiser". O BE na sua nova estratégia diz " enquanto o PS tiver a expressão eleitoral que tem não alterará as suas politicas neoliberais". Isto é, estão ambos a dizer a mesma coisa com palavras diferentes, e a fazerem do seu crescimento eleitoral a pedra angular da sua acção politica.

E o que nos diz a prática?
Diz-nos que esta estratégia nada tem a ver com a tendência que se verifica.

Reparem que o PS ganhou as eleições legislativas de 2009 com 36,55% de votos e, apesar da violenta ofensiva que lhe moveram as oposições de direita e de esquerda, as últimas sondagens dão-lhe 33% de intenções de voto! E a esquerda que nas últimas eleições legislativas obteve cerca de 18% de votos, as mesmas sondagens reduzem agora para 14% as intenções de voto. Bem sei que sondagens são sondagens, mas elas dão-nos sinais que não devemos ignorar. E não me admirava nada que o PS recupere mais 3 ou 4 pontos percentuais, e que a esquerda acabe tendo menos deputados do que teve na A.R. agora dissolvida!

É óbvio que o aumento da expressão eleitoral da esquerda é uma preocupação que deve estar sempre presente em toda a acção politica, pois quanto maior for a expressão eleitoral maior é o poder de negociação e mais fácil se torna "impor" politicas de esquerda. Mas não nos iludamos, pois nem a esquerda subirá ( se subir! ) o suficiente para impor as suas politicas, nem o PS descerá ( se descer! ) o suficiente para mudar de politicas.

De resto, não menosprezando a atenção que se deve dar ao aumento da expressão eleitoral da esquerda, a questão principal não é essa, mas sim saber traçar objectivos concretos e adequados às circunstancias e persegui-los com inteligência e determinação.E na actual correlação de forças, uma pequena força politica pode determinar a orientação do conjunto.

Às vezes, como sabemos por experiência própria, o problema não é de falta de força, mas sim de falta de jeito !

5 - Os últimos 25 anos foram repletos de lutas, estratégias, engenharias tácticas e alquimia politica. Os resultados ( ou falta deles! ) provam que o caminho é outro.

É curioso que tenha sido Manuel Alegre a dizer ( a propósito do encontro BE/PCP) que " no actual estado do mundo e da europa, uma convergência de esquerda não se pode fazer sem o PS e muito menos contra o PS"

Se substituir a palavra "esquerda" por "centro-esquerda" ( pois não considero o PS um partido de esquerda, mas sim de centro-esquerda" ) é exactamente o que tenho andado a dizer e a escrever há muitos e muitos anos. Infelizmente sem grandes resultados!

Mas tenho a convicção ( e a esperança ) de que os ´resultados das próximas eleições legislativas antecipadas evidenciem sem margem para dúvidas, de que é este o caminho que a esquerda tem que trilhar. Não para implementar "politicas socialistas" ( é ridículo pensar que estão reunidas as condições para tal! ) , mas para implementar politicas de centro-esquerda que melhorem no curto prazo as condições de vida dos trabalhadores, que dinamizem a economia, que reduzam o desemprego e tragam alguma segurança e confiança no futuro. E que até ao fim da legislatura nos permitam alcançar um patamar de desenvolvimento que nos aproxime da média da U.E.

6 - E quanto à RC ?

Em minha opinião, a RC deve adoptar claramente esta linha estratégica, porque me parece não só a mais adequada nas circunstâncias actuais, mas também porque não só não é contraditória com os princípios da RC, como lhes dá conteúdo prático.

A RC deve, pois, intervir na campanha eleitoral que se avizinha, defendendo e divulgando esta linha estratégia. Em termos práticos, pugnar para que na próxima A.R. volte a existir uma maioria de deputados do PS/PCP/BE. E que dessa base maioritária emane um governo com um programa mínimo comum a ser implementado durante a próxima legislatura.

E, naturalmente, deixando a cada um de nós toda a liberdade para discordar e manifestar essa discordancia e apoiar expressamente este ou aquele partido, utilizar todo o nosso capital politico ( capacidade, experiência e tolerância democratica ) de modo a potenciar na diversidade politica do centro-esquerda a agregação de vontades para materializar este objectivo.

Podem dizer-me: ainda que fosse este o caminho ( e isso está por demonstrar ! ) não existem condições objectivas e subjectivas para ser possível percorrê-lo.

Então, meus caros amigos, se assim é lamento muito, mas nesse caso cada um assumirá as suas responsabilidades.

E se a esquerda está tão fossilizada e refém do seu passado que já não consiga fazer esse "golpe de asa", então talvez tenha chegado a hora de reinventá-la!

@ de mão amiga.

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